terça-feira, 26 de junho de 2012

esses soluços que nos engasgam e turvam a vista não poderiam fazer parte daquela cena.
havia todo um ensaio. havia todo um script que deveria ser seguido.
ou as horas longas que foram passadas a tramar o fim se reduziram a um sussurrado: "te amo"?
.
a festa era colorida e as pessoas bebiam. pareciam, em realidade, estar de porre coletivo.
não lembrava a hora que entrou na festa. lembra sim de beijar algumas pessoas, de sorrir para outras, mas não lembrava de nomes...
queria afogar as mágoas e dar o troco. cada vez que imaginava o que o outro estava fazendo procurava, mentalmente, afogar a imagem em um beijo desconhecido.
foi assim, de beijo em beijo, quase sóbrio que beijou alguém diferente, mas igual a quem queria esquecer.
"a sobriedade enlouquece".
e fez ver que fugir para aquele mundo noturno sem resolver o problema só causava mais estranheza. só causava mais desconforto.
dançando e bebendo planejava ser mau. planejava julgar e dizer verdade. imaginava-se apontando o dedo para o outro dizendo "você não me merece".
(não percebia que se o outro não o merecesse ele próprio não estaria fazendo aquela cena na festa...)
chegou em casa quando já havia sol. curado da bebedeira na própria festa, dormiu em um sofá no canto do bar. em casa, dormiu na cama, com a roupa da festa e o pé sujo do próprio vômito.
.
à tardinha marcaram um encontro. ninguém tinha mais nada a dizer a ninguém.
limpo e com o cabelo ajeitado, sentado em um banco e recuperado da ressaca, ele esperava pacientemente o ex-rolo. ao longe, fumando, vinha ele com óculos de grau e feição séria. sentou-se ao seu lado:
"já não é a primeira vez que você faz isso. ao menos dessa vez não transou com ninguém (que eu saiba)."
"mas..."
"uma puta tem mais dignidade, porque ao menos cobra o que você faz de graça."
silêncio.
"eu te amo."
"eu sei."
houve silêncio. e um soluço leve.
"não farei mais isso. foi a última vez."
um beijo selou a cena. e ele pensou "quão grande ator eu sou..." - era a própria a reencarnação de Nero!
o outro sorriu "ainda te tenho!"- sem haver distinção entre cinismo e verdade.
enfim, era uma relação temerosa, na qual os dois preferiam jogar ao invés de se amarem.
Ainda poriam fogo na Cidade e tocariam harpa!

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