quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A gola azul com listras brancas da camisa sob o suéter era uma moldura perfeita para aquele rosto mediterrâneo. Combinava com os tons pastéis que faziam parte do corpo do homem que sentava à mesa, a sua frente no café.
Com as mãos postas sobre a mesa, ele brincava com uma colher de chá, apertando uma das pontas, fazendo-a tilintar... Com o canto dos olhos, mirava os dedos inquietos, enquanto sua amiga, de costas para o homem, falava das últimas novidades da repartição.
"Seu café vai esfriar."
"Como?"
"É. Vai esfriar." Repetia a amiga, que não se dava conta da situação ao seu redor.
O homem mediterrâneo percebeu que era avaliado e esboçava corresponder aos olhares. Levou a mão direita à nuca e coçou, sem jeito, o cabelo. Baixou o rosto e ficou esperando um café que logo chegou.
A fascinação não era tanto física. Ou melhor, era. Mas também biológica. Imaginava qual era a ascendência desse ser tão deslocado, tão diverso dos outros todos daquele lugar. Será que pertencia a alguma descendência siciliana, maltesa?
Gostava de pensar nessas coisas e, por vezes, se perdia nesses pensamentos um tanto incabíveis. A sua frente a amiga já notava que ele divagava e perguntava a ele o que estava a pensar.
"Penso que há algum gene grego naquele homem..."
"Como assim!? Você está brincando comigo?!"
E ela iniciou a discursar sobre as absurdidades que ele sempre propunha nos momentos mais "importantes" da vida, como aquele em que discutiam o futuro profissional dela. Ela discorria veementemente sobre essas questões delicadas e ele imaginava que aqueles cabelos negros eram fruto de um gene compartilhado com Heitor, imaginava que os olhos levemente apertados pertenciam a algum ancestral etrusco...
E assim perdido em indagações, ia imaginando uma história para cada pessoa que prendia a sua atenção. Percebia que o homem mediterrâneo possuía uma boca grande, muito bonita, como um catalão...
" Querido, vou indo... Vamos?"
"Claro. Claro! Vamos para onde? Pensei em Barcelona..."

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